Karl JASPERS
Introdução ao Pensamento Filosófico
Editora Cultrix, p. 138 - 148.
1. Seja a filosofia o que for, está
presente em nosso mundo e a ele necessariamente se refere.
Certo
é que ela rompe os quadros do mundo para lançar-se ao infinito. Mas retorna ao
finito para aí encontrar seu fundamento histórico sempre original.
Certo
é que tende aos horizontes mais remotos, a horizontes situados para além do
mundo, a fim de ali conseguir, no eterno, a experiência do presente. Contudo,
nem mesmo a mais profunda meditação terá sentido se não se relacionar à existência
do homem, aqui e agora.
A
filosofia entrevê os critérios últimos, a abóbada celeste das possibilidades e
procura, à luz do aparentemente impossível, a via pela qual o homem poderá
enobrecer-se em sua existência empírica.
A
filosofia se dirige ao indivíduo. Dá lugar à livre comunidade dos que, movidos
pelo desejo de verdade, confiam uns nos outros. Quem se dedica a filosofar
gostaria de ser admitido nessa comunidade. Ela está sempre neste mundo, mas não
poderia fazer-se instituição sob pena de sacrificar a liberdade de sua verdade.
O filósofo não pode saber se integra a comunidade. Não há instância que decida
admiti-lo ou recusá-lo. E o filósofo deseja, pelo pensamento, viver de forma
tal que a aceitação seja, em princípio, possível.
2.
Mas como se põe o mundo em relação com a filosofia? Há cátedras de filosofia
nas universidades. Atualmente, representam uma posição embaraçosa. Por força
da tradição a filosofia é polidamente respeitada, mas, no fundo, objeto de
desprezo. A opinião corrente é a de que a filosofia nada tem a dizer e carece
de qualquer utilidade prática. É nomeada em público mas - existirá
realmente? Sua existência se prova, quando menos, pelas medidas de defesa a que
dá lugar.
A
oposição se traduz em fórmulas como: a filosofia é demasiado complexa; não a
compreendo; está além de meu alcance; não tenho vocação para ela; e, portanto,
não me diz respeito. Ora, isso equivale a dizer: é inútil o interesse pelas
questões fundamentais da vida; cabe abster-se de pensar no plano geral para
mergulhar, através de trabalho consciencioso, num capítulo qualquer de
atividade prática ou intelectual; quanto ao resto, bastará ter “opiniões” e
contentar-se com elas.
A
polêmica torna-se encarniçada. Um instinto vital, ignorado de si mesmo, odeia a
filosofia. Ela é perigosa. Se eu a compreendesse, teria de alterar minha vida.
Adquiriria outro estado de espírito, veria as coisas a uma claridade insólita,
teria de rever meus juízos. Melhor é não pensar filosoficamente.
E
surge os detratores, que desejam substituir a obsoleta filosofia por algo de
novo e totalmente diverso. Ela é desprezada como produto final e mendaz de uma
teologia falida. A insensatez das proposições dos filósofos é ironizada. E a
filosofia vê-se denunciada como instrumento servil de poderes políticos e
outros.
Muitos
políticos vêem facilitado seu nefasto trabalho pela ausência da filosofia.
Massas e funcionários são mais fáceis de manipular quando não pensam, mas tão
somente usam de uma inteligência de rebanho. É preciso impedir que os homens se
tornem sensatos. Mais vale, portanto, que a filosofia seja vista como algo
entediante. Oxalá desaparecessem as cátedras de filosofia. Quanto mais vaidades
se ensine, menos estarão os homens arriscados a se deixar tocar pela luz da
filosofia.
Assim,
a filosofia se vê rodeada de inimigos, a maioria dos quais não tem consciência
dessa condição. A auto complacência burguesa, os convencionalismos, o hábito de
considerar o bem-estar material como razão suficiente de vida, o hábito de só
apreciar a ciência em função de sua utilidade técnica, o ilimitado desejo de
poder, a bonomia dos políticos, o fanatismo das ideologias, a aspiração a um
nome literário - tudo isso proclama a antifilosofia. E os homens não o percebem
porque não se dão conta do que estão fazendo. E permanecem inconscientes de que
a antifilosofia é uma filosofia, embora pervertida, que, se aprofundada,
engendraria sua própria aniquilação.
3.
O problema crucial é o seguinte: a filosofia aspira à verdade total, que o
mundo não quer. A filosofia é. portanto, perturbadora da paz.
E
a verdade o que será? A filosofia busca a verdade nas múltiplas significações
do ser-verdadeiro segundo os modos do abrangente. Busca, mas não possui o
significado e substância da verdade única. Para nós, a verdade não é estática e
definitiva, mas movimento incessante, que penetra no infinito.
No
mundo, a verdade está em conflito perpétuo. A filosofia leva esse conflito ao
extremo, porém o despe de violência. Em suas relações com tudo quanto existe, o
Filósofo vê a verdade revelar-se a seus olhos, graças ao intercâmbio com outros
pensadores e ao processo que o torna transparente a si mesmo.
Quem
se dedica à filosofia põe-se à procura do homem, escuta o que ele diz, observa
o que ele faz e se interessa por sua palavra e ação, desejoso de partilhar, com
seus concidadãos, do destino comum da humanidade.
Eis
por que a filosofia não se transforma em credo. Está em contínua pugna consigo mesma.
4. A
dignidade do homem reside em perceber a verdade. Só a verdade o liberta e só a
liberdade o prepara, sem restrições, para a verdade.
É
a verdade o significado último para o homem no mundo? É a veracidade o
imperativo último? Acreditamos que sim, pois a veracidade sem reservas, que não
se perde em opiniões, coincide com o amor.
Nossa
força está em agarrarmos os fios de
Ariadne que a verdade nos lança. Mas a verdade só é a verdade total. É preciso
que a verdade múltipla seja levada a convergir para a unicidade. Jamais
chegamos a possuíres a verdade integral. Eu a nego quando vou ao extremo da
afirmação, quando erijo o que sei em absoluto. Eu a nego também quando tento
sistematizá-la em um todo, porque a verdade total não existe para o homem e
porque essa ilusão o paralisa.
Todo
aquele que se dedica à filosofia quer viver para a verdade. Vá para onde for,
aconteça-lhe o que
acontecer, sejam quais forem os homens
que ele encontre e, principalmente, diante do que ele próprio pensa, sente e
faz — está sempre interrogando. As coisas, as pessoas e ele próprio devem
tornar-se claros a seus olhos. Ele não se afasta de seu contacto. Ao contrário,
a ele se expõe. E prefere ser desgraçado em sua busca da verdade a ser feliz na
ilusão.
Faz-se preciso que o que é se ponha manifesto.
É
possível certa confiança, mas não a certeza. A verdade, mesmo quando nos abate,
revela — se for realmente a verdade — aquilo que nos salva. E produz-se o
milagre da filosofia: se recusarmos todos os enganos, afastarmos todos os véus,
expusermos à luz todas as insinceridades, se nos obstinarmos a avançar de olhos
abertos, sujeitando nossas críticas a outras críticas, essa crítica terminará
por não ser destruidora. Muito ao contrário, veremos, por assim dizer,
revelar-se o próprio fundamento das coisas onde vemos luz, como um restaurador
vai-se apercebendo de um Rembrandt por sob a pintura posterior que o escondia.
E
se a luz não se revelar? Se, ao fim, o homem descobrir a máscara de Górgona e
vir-se transformado em pedra? Não temos o direito de olvidar que isso é
suscetível de acontecer. A filosofia se expõe a abismos diante dos quais não
deve fechar os olhos, assim como não pode esperar que desapareçam por encanto.
Torna-se mais clara do que nunca a
questão que, desde o início, se pôs para o homem. O “sim” para a vida é a grande e bela aventura, porque permite a
realização da razão, da verdade e do amor. O “não” à existência, traduzido pelo suicídio é a realidade para homens
diante do cujo segredo permanecemos calados. Põe-se fronteira que não temos o
direito de esquecer.
5. A filosofia se destina ao
homem enquanto homem ou apenas a uma elite fechada em si mesma? Para Platão,
poucos homens são aptos para a filosofia e só adquirem tal aptidão após longa propedêutica.
Há dois tipos de vida na Terra, disse Plotino, um próprio dos sábios e o outro
da massa dos homens. Também Espinosa só espera filosofia do homem excepcional.
Kant, porém, acredita que a rota por ele traçada pode tornar-se um caminho
real: a filosofia aí está para todos. E seria mau se fosse diferente. Os
filósofos não passam de elaboradores e guardiães de atas, onde tudo deve estar
justificado com precisão máxima.
Contra
Platão, Plotino, e quase toda a tradição, acompanhamos Kant. Trata-se de uma
decisão filosófica de grande alcance para a atitude interior do filósofo.
Corresponde a uma recusa de se prosternar diante da realidade; foi assim até
agora e assim é hoje; mas não deve permanecer assim e assim não continuará.
Dar-se-ão ouvidos a exigências do homem como homem, exigências freqüentemente
ocultadas e reduzidas de importância, afastadas e negligenciadas. A decisão
cabe a cada indivíduo.
Estaremos,
talvez, transformando em virtude a trágica ausência de uma filosofia genial em
nosso tempo? Não, a experiência de nossa própria mediocridade, do homem que,
embora simples homem, pode compreender os grandes homens do passado,
apropriar-se do que realizaram, aproximar-se deles, cheio de respeito, mas sem
divinizá-los — essa experiência é encorajadora. O que está a nosso alcance está
ao alcance de todos ou de quase todos, bastando que verdadeiramente o queiram.
Há,
na História, uma grande exceção. Os padres da Igreja cristã considerando que
lhes tocava o dever de enunciar a salvação e de praticar obras de amor,
dirigiam-se a todos os homens. E encontravam um argumento contra os filósofos
gregos no fato de estes só se dirigirem aos eleitos. Lema da Igreja foi:
ninguém que deseje crer está excluído. Aquilo que se revela, a plena claridade,
nos sublimes pensamentos dos eleitos
esta contido na fé mais simples.
Contudo,
tal solicitude pelas massas é ambivalente: deseja dominá-las e, ao mesmo tempo
e no interesse de dominá-las, tolera a mentira e a superstição e se envolve no
político. Em razão disso, esse grande exemplo histórico não nos pode servir de
modelo.
Outro
inimigo da filosofia independente e, portanto, da liberdade do homem é o
pensamento pretensamente democrático. Há razão em proclamar: o que não convém a
todos deve, um dia, desaparecer. O que não desperta qualquer eco é, a priori,
desprovido de realidade. Mas é errôneo afirmar: sabemos qual seja essa
realidade; o que hoje é, sempre será; o que não atua agora, jamais atuará; o
homem não se modifica. Antes, caberia dizer: o que ainda está isolado poderá
expandir-se; o que hoje não encontra eco poderá encontrá-lo amanhã; e,
principalmente, o que é real para reduzido número de pessoas poderá tomar-se a
realidade suprema de uma época e, sob tal forma, perpetuar-se; o que ainda não
atingiu as massas poderá penetrá-las no futuro.
Para
libertar-se é inevitável que a verdade desça às massas, ao burburinho sonoro e
confuso dos homens. A alternativa seria o domínio sobre as massas, a censura, a
educação padronizada. E os seres humanos se tornariam matéria-prima - para os
déspotas.
Na
incerteza, uma só coisa permanece: crer na possibilidade de liberdade humana e,
alimentando essa crença, conservar-se ligado à Transcendência, sem a qual
aquela convicção soçobraria.
6.
Continua-se a afirmar que, no mundo, a filosofia está consciente de sua
impotência. Desperta poucas respostas e não dispõe nenhum poder de modelar o
mundo; não é, de maneira alguma, um fator da História. Assim pareceu até agora.
Mas
a filosofia está longe de ser impotente no que diz respeito ao indivíduo. Aí,
ela constitui, muito ao contrário, a grande força que leva o homem a encontrar
o caminho para a liberdade Só ela possibilita a independência interior.
Ganho essa independência exatamente quando e onde pareço completamente
dependente, ou seja, quando reconheço que em minha liberdade, em meu amor, em
minha razão - fui dado a mim mesmo. Nenhuma dessas coisas está sob meu poder eu
não as faço surgir. Mas tudo quanto eu fizer surgir delas derivará.
Se
atinjo o ponto em que sou dado a mim mesmo, distancio-me de todas as coisas e,
inclusive, de mim. Como que de um plano de observação externo a mim em verdade,
inatingível contemplo o que acontece e o que faço. como se me fosse preciso
atingir aquele plano para mergulhar na realidade histórica. De lá jorra a luz
que faz crescer minha liberdade interior. Torno-me independente na medida em
que vejo as coisas a essa luz.
Essa
independência é uma quietude, sem violência e sem orgulho. Tanto menos soberba
quanto mais segura de si mesma. Evidencia-se permanecendo em obscuridade.
Na
independência, a liberdade não permanece vazia. Limitar-se a si mesmo não seria
independência. A independência quer participar do mundo. Age. Ouve e responde
aos apelos da sorte. Não foge às exigências do dia. Quando o destino parece
deter as rédeas, ousa envolver-se em situações de risco, na esperança de vir a
domina-las.
Não
obstante, aceita sempre critérios que não pode trair porque provêm de sua mesma
origem. Traí-los seria aniquilar-se.
7. A independência do filósofo torna-se falsa
quando se mescla de orgulho. No homem autêntico, o sentimento de independência
sempre se acompanha do sentimento de impotência. o entusiasmo de poder sempre
se acompanha do desespero de não poder, a esperança sempre se acompanha de um
olhar lançado ao fim. Filosofar dá-nos lucidez total acerca das várias formas
de nossa dependência, mas de maneira tal que, em vez de permanecermos esmagados
por nossa impotência, encontramos, a partir de nossa independência, meio de
recuperação.
a)
O quantitativo tem predominância sobre o qualitativo. O universo, no seio do qual, a Terra, com
todos os seus habitantes, não passa de um grão de poeira, tem predominância
sobre nosso planeta. Na hierarquia em que figuram matéria, vida, alma e
espírito, cada um dos estágios tem predominância sobre o seguinte. Ao fim, é a
massa que tem preeminência. Diante dela, o indivíduo não conta. Só conta o
universo, a matéria, a massa, o que tem peso.
Invertamos, porem, a escala de
valores: o que há demais precioso no universo é o homem; na hierarquia das
realidades, é o espírito; entre as massas, o indivíduo como ele próprio; entre
as obras da natureza, as criadas pela arte humana. Se julgamos as coisas de
maneira diversa, é por sucumbirmos à tentação do quantitativo e renunciarmos ao
senso do humano.
b)
O conjunto da História — que ninguém pode conhecer, que não precisamos imaginar
necessariamente como uma totalidade — avassala-nos. O indivíduo sente-se
indefeso. Tudo o que ele é, é determinado por aquele conjunto. E ele deve
curvar-se.
Entretanto,
o que se passa com a humanidade passa-se como resultado das farsas ínfimas de
bilhões de indivíduos. Cada um é responsável pelo que faz, pela maneira como
vive. Parece-nos que a História não tenha sentido, mas ela está penetrada de
razão. E essa razão depende de nós.
Permanece,
porém, o fato de que diretamente real para nós é o meio que, de imediato, nos
cerca. Nosso primeiro dever é para com ele. Quando desesperamos do futuro,
porque não podemos orientar o curso dos acontecimentos, ou quando nos exaurimos
em clamores vãos, como se disso dependesse o movimento do universo, estamos
esquecendo o que nos toca mais de perto. Afirmamo-nos na realidade desse
pequeno mundo que nos cerca. E, através dele, participamos do conjunto.
8. Na época atual, fazemo-nos
conscientes de nossa impotência divisando-lhe um ângulo novo. Todos sabemos que
a democracia é corrupta no seu operar, embora continue sendo a única via
possível para a liberdade. Mais duvidoso e seu alcance entre povos em que ela
não tem origem histórica própria.
Satisfazer-se
com o milagre econômico é o ópio do mundo livre. O resto do mundo inveja esse
milagre, mas não tem as condições capazes de propiciá-lo e lança ao mando livre
a culpa de suas desventuras.
No mundo ocidental. o econômico
predomina sobre o político. E isso eqüivale a dizer que o Ocidente está cavando
a própria cova Nele, a liberdade política se reduz constantemente. É, com
freqüência, incompreendida. Assiste-se à desaparição do sentimento de liberdade
e do espírito de sacrifício.
Em todo o mundo, manifestam-se
tendências à ditadura militar e ao totalitarismo, pois a liberdade se degrada.
Os povos se fazem presa dos poderosos.
Se continuar, a explosão demográfica
levará necessariamente a uma conflagração que exterminara inúmeras vidas
humanas.
Os povos de cor (mais de dois terços
da humanidade) voltam-se contra os brancos, cheios de ressentimento e com
determinação crescente.
A
bomba atômica pesa sobre todos nós. Por algum tempo, ela continuará a impedir a
grande conflagração que (não sabemos quando) provocará o aniquilamento total,
se os homens continuarem a ser o que são hoje.
Até
agora, quando Estados, povos ou civilizações pereciam, outros lhes tomavam o
posto. Um elemento permanecia — a humanidade. Atualmente, caberia perguntar se
a humanidade não está a ponto de cometer suicídio generalizado.
No
ínterim, podemos gozar a vida, permanecendo, porém, ao pé do cadafalso. Ou
afastamos o perigo mortal ou deveremos estar preparados para a catástrofe.
É
escandalosa a tranqüilidade do mundo ocidental, tranqüilidade baseada na
presunção de que essa agradável maneira de viver terá duração indefinida. As
conseqüências das ilusões voluntárias de antes e após 1914 não nos terão
ensinado ao que leva essa irresponsabilidade política e moral?
Nossa
época vive entre dois abismos. Compete-nos escolher: deixar-nos tombar no
abismo da ruína do homem e do universo, com a conseqüente extinção de toda vida
terrena, ou cobrar ânimo para nos transformarmos, dando surgimento ao homem
autêntico, ante o qual se abrirão possibilidades infinitas.
9. Em tal contexto, qual o papel da filosofia?
Ensina,
pelo menos, a não nos deixarmos iludir. Não permite que se descarte fato algum
e nenhuma possibilidade. Ensina a encarar de frente a catástrofe possível. Em
meio à serenidade do mundo, ela faz surgir a inquietude. Mas proíbe a atitude
tola de considerar inevitável a catástrofe. Com efeito, apesar de tudo, o
futuro depende também de nós.
Se
fosse vigorosa em sua elaboração, convincente por seus argumentos e digna de fé
pela integridade de seus expositores, a filosofia poderia tornar-se instrumento
de salvação. Só ela tem o poder de alterar nossa forma de pensamento.
Mesmo
diante do desastre possível e total, a filosofia continuaria a preservar a
dignidade do homem em
declínio. Numa comunidade de destinos, que se apóie na
verdade, o homem encara face a face seja o que for.
Não
se confunde o declínio com o nada. Em meio ao desastre, a última palavra cabe
ao homem, que ama e conserva confiança incompreensível no fundamento das
coisas.
Para falar sob forma de enigma: a origem de
que brotaram o universo, a terra, a vida, o homem e a História encerra
possibilidades que nos são inacessíveis. Enfrentando de frente o desastre,
asseguramo-nos dessas possibilidades.
Fazemos uma tentativa, à qual outras
hão de seguir-se, continuadamente. Mas, presentes, por um instante, nessa
tentativa, o amor e a verdade atestam tratar-se de 1 mais que uma tentativa.
Uma palavra de eternidade foi pronunciada.
Nenhum
pensamento suscetível de ser concretizado, nenhum conhecimento, nada de fisicamente tangível,
nenhum dos enigmas por nós mencionados pode adentrar a eternidade.
Mas, para alem de todos os enigmas, o pensamento
penetra no silêncio pleno de insondável razão.